19.8.08

VIII

Seus olhos ardiam como dois sóis. O gosto do sangue, mais forte do que nunca, lhe subiu à boca. Doía-lhe o peito. O discreto tremor percorria o corpo. Já não era mais tão discreto. A senhora percebeu o comportamento estranho no rapaz. Parou de falar. Deixou o quarto rapidamente. Estava intimamente apavorada. Muito religiosa, sofria de um medo incontrolável em situações bruscas, lugares escuros e na companhia de homens estranhos.
Saiu do quarto deixando Bernardo sozinho. A dor no peito e o sabor de sangue ficaram. Tísico sabor, as lembraças da surra que ele e a menina levaram, no dia em que a velha se mostrara os profundos olhos à sombra do marido, completavam sua mente. O torpor alí, deitado na cama, lhe trazia os olhos da velha. A dor da surra pouco importava. Bernardo e a menina haviam apanhado com a raiva do velho. De punho aberto, as barbas brancas encrespadas esvoaçaram até a moça desvençilhar-se do locatário do quarto. Sinceramente, Bernardo não guardava rancores. Tampouco tentara reagir. O aluguel do quarto era barato. Além do mais, o velho era ligeiramente mais alto do que ele e pesava algo como cem quilos a mais do que ele. O ato coadjuvava na cabeça do rapaz. A garota, que o maldissera e suas quinhentas gerações futuras, era insignificante. Hematomas por todo o corpo de uma pequena e magra moça de seus vinte anos. Branca como a neve, sua pele transformara-se em roxo. Tanto fazia. O quanto Bernardo gastava pela comida, teto e a limpeza das roupas, compesava.

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