13.5.06

A Queda (Mário de Sá-Carneiro)

E eu que sou o rei de toda esta incoerência,
Eu próprio turbilhão, anseio por fixá-la
E giro até partir... mas tudo me resvala
Em bruma e sonolência.

Não me pude vencer, mas posso me esmagar,
- vencer às vezes é o mesmo que tombar -
E como inda sou luz, num grande retrocesso,
Em raivas ideais, ascendo até o fim:
Olho do alto o gelo, ao gelo me arremesso...

Tombei....
E fico só esmagado por mim!...

9.5.06

e tudo, toda essa liberdade e leveza concedidas, me levam a fazer coisas das quais muito me agrado.
...

chega de gotejar-te com mel, senhorita.
perdida em pensamentos, é assim que te vejo.
dos olhos e das grossas madeichas cor de mel, e de um rosto calmo e claro como teu próprio nome presume.
muito inseguro, fico ao teu lado e te amo assim avechado. muito inseguro, como ficam os que se deparam com a grandeza incompreensível de um astro cerrado em sí, um astro que guarda inplícito seus por ques - me explicaste isso uma noite.
fico em devaneios até perceber que não há no que pensar. a ausência de razões claras talvez me diga que certezas são só as minhas.
as únicas verdades são as que te atribuo, assim é. as únicas verdades são as que enxergo em tí.
não me dizes coisa alguma, entendo. e isso é muito bom: não me dizeres nada.
Assim, sei que tua voz soa, nítida em meus ouvidos, quando tenho nítido tudo aquilo que a mim me lego.
faz tempo
quanto tempo
não pensar é pensar em dobro
não me afobo, nem assombro
sei que estarei contigo
na hora de gozar
o segundo sereno do esporro.

4.5.06

Neto,

Esta "calça", ganhei faz tempo, mas
para mim tem 2 defeitos.
1 - ñ tem bolsos
2 - é comprida demais

Vê se te serve, tá?


Renata

3.5.06

II

(um banheiro excesivamente claro, todo em azuleijos brancos e com um pequeno espelho em frente à pia)

1-(entra no banheiro com uma toalha por sobre o ombro) você ainda esta escovando os dentes? caramba!... (pindura a toalha e observa-o)
2-(cospindo o creme dental e analizando os dentes no espelho) pois é.
1- nossa! tô precisando urgente de um banho...
2-(ainda nos dentes) eu não acho que você precise de banho, gosto do seu cheiro.
1-(para a platéia - nitidamente irritada) quanta sensibilidade. o cara nem olha na minha cara pra dizer um negócio desses e espera me convencer.
2-(ainda nos dentes) sabe, cheiro é um negócio importante. o cheiro com certeza expressa muito o caráter do indivíduo e talvez seja mesmo parte dele; do caráter. e ainda mais agora... (muito desanimado)é difícil acostumar com a minha condição...
2- (olhando para ela com a sinceridade do fundo dos olhos) por um lado parece-me que você se banhando seria como eu perdendo-lhe um pouco mais para a terra, como eu mais uma vez não conseguindo dividí-la com as carências dos outros, sabe?(como quem rememora, mas com olhar profundo, fugidio e severamente interrogativo) dessas coisas de ter que tomar banho pra não mostrar para os outros o cheiro da pele...; e o cheiro? não equipara-se ao sentir a concistência da carne, ao sabor do corpo, ao prazer sexual e intelectual, ou simplesmente à beleza plástica... ou simplesmente à beleza dos sons...?(um contido rosto alegre e esperançoso) eu não gostaria de perder isso de você; não agora.
2- você não sabe como têm sido um saco esses último tempos. tenho andado muito sozinho. depois do que aconteceu, por mais que eu esteja rodeado por pessoas, todas me são estranhas, me sinto deslocado. há algo faltando em cada coisa.
2- muito diferente foi essa noite. juro que se tivesse algum peso sobre essa decisão diria para que você não se banhasse. o seu cheiro é bom.
2- (se animando, mas sem tanta convicção) mas logo falando convenço-me, também, de que a privação de não estar presente a uma bela cena como essa me dói bastante; putz, vai ser muito bom estar aqui com você, durante o seu banho.
1- que tal se fizer-mos um trato? durante nossos encontros só tomamos banho sem sabão ou qualquer outro desses produtos, o que você acha? a mim parece muito legal - também acho muito bom os cheiros estarem mais presentes.
2- que bom. adorei.
1- legal. tá combinado.
2- ok

ele volta a escovar os dentes enquanto ela arruma suas coisas por cima da tampa da privada. ela termina e ele não, o que a deixa pensativa. e ela retoma o assunto receosa

1- agora... eu estou aqui enrolando porque não vou tomar banho com você presente no banheiro.
2-(timidamente espantado) mas, por que?
1-(num misto de pasmada e debochada) imagina! você tá ficando louco. meu irmão esta aí, iria ser uma situação constrangedora para mim
2- mas, por que?

desencana, todo mundo sabe
não. sera?

2.5.06

1- eu tomaria um belo de um chope, agora, e fumaria um cigarro.
2- chope eu desço para comprar, mas nada de cigarro, tô precisando parar...
1-(com voz zombeteira) ah...! você fumou a noite inteira, lá no bar. Em um dia, mais do que eu fumo na semana...ah, sai fóra.
2-(cabisbaixo) é verdade, né? eu falo isso desde que comecei, sabia?... mas beleza, um dia eu paro... por repetição, sabe como é? fico repetindo isso pra mim mesmo todo dia, quem sabe autosugestão resolva o caso.
2-(levanta a cabeça e vira-se para ela) está bem, eu vou lá comprar o aditivo e a chaminé...! - (vagarosamente vira-se para o público, com um olhar baixo e distante) - nesse momento eu poderia beijá-la e abraçá-la infinitas vezes, dar um tempo para os nossos corpos conversarem; isso seria bom... deixa para depois(e tenciona se levantar)...
1-(segura-o, e diz sorrindo) ei... calma. tá com pressa?... não dá pra ter pressa na primeira, a gente tem algumas horas ainda. eu não tenho compromissos amanhã, você tem?... no que você trabalha?... Se não tiver, bem que dava pra fazer um almoço, compramos algumas coisas no mercado daqui a pouco. e depois durmimos umas horinhas e você vai, que tal?
2- (neutro e vai se animando com a possibilidade) pode ser uma boa idéia, eu sei uma receita legal com abobrinha, vai molho branco e humm... nossa, posso sentir o cheiro, você vai gostar. e é barata!
1- (alegre e com uma risada pra dentro) ha, haa... por vezes acho que eu vivo demais de poesia, me cansa... mas eu não consigo... imagina: você cozinhando para mim é muito bonito, é como o sol que alimenta a planta, ou o homem semeando a terra. é como uma caricia, saber acariciar no momento certo, perceber o tempo, cumprir a tarefa que o tempo exije... gosto de homens que sabem cozinhar.
2- (brincalhão) eu cozinho para você e depois...
1- ha ha ha, engraçadinho... - (levanta, séria, o olhar até ele e aos poucos se solta) - eu estou falando sério, escuta quando eu falo de mim - eu não preciso só de comida para ser semeada e desabrochar em flor, pra isso são necessárias algunas coisitas a mais.
2- (riso de conveniência com a garganta) hã hãã... é vero... - (agora atônito e novamente perdido em pensamentos, com a platéia) - e agora? será necessário dizer alguma coisa, alguma coisa inteligente e encantadora? mas só tenho vontade de ouvir a voz dela me falando das suas coisas e de grudar na sua pele... tem um poeta que diz alguma coisa parecida com "o silêncio são as obras completas do poeta que nada deixou escrito", deve ser o meu caso, talvez eu faça poesia com gestos. mas de nada adianta se ela não entender os gestos. tenho de convir que seria demais exigir que compreendesse meu silêncio de contemplação conhecendo-me ela a tão pouco tempo... as vezes, o silêncio fica muito próximo da dissimulação, não é verdade? me sinto obrigado a falar algo de muito relevante, mas qual?!
2-(terno) é impressionante o como você é bonita, sabia? fico impressionado mesmo...
1-(ela responde com um sorriso encabulado)
2-(com a voz mansa e aveludada) e que tal se dormissemos agora, hm?...
1-(a meia-voz) estava pensando na mesma coisa...
2- levantamos à tarde e fazemos uma comidinha gostosa... depois cada um pro seu canto, buáá
1- ai, como ele é carente
2- he he... ok, combinado. então vou escovar os dentes (se levantando da cama)
1- esta bem... daqui a pouco vou tomar banho... (ele já saia do quarto)