16.8.07

A luz foi apagada. Estávamos em um carro. Eu atrás, meu irmão e ela nos bancos dianteiros.
Eu aguardava alguma razão que explicasse a ausência de luz. Talvez fosse o momento de sairmos do carro. Chegáramos ao fim do percurso, ou haviamos batido em algo... o carro parara e eles haviam apagado a luz. Aliás, eu não aguardava nenhuma razão. Me parecia muito natural que houvessem apagado a luz; como um prólogo. Não ansiava por nada. Limitava-me a observar o movimento dos outros dois.
Porém, nada acontecia à minha frente. E eu, ali, inerte, aguardava. Sempre que uma luz se apaga, a gente fica ali esperando que aconteça alguma coisa. A menos que se vá dormir. Ao fim do dia, realmente, eu não espero nada além de uma fria luz se apagando. Para poder descansar umas quatro horinhas antes de levantar novamente. Fora esse momento específico, e talvez no caso de um canceroso em fase terminal, ninguém pode ficar contente sem luz. Ou sem que alguma coisa aconteça depois que ela apaga. Eu não consigo. Não consigo e não estava conseguindo naquele momento. A luz apagada e nada de porta se abrir, de alguém falar qualquer coisa, ou de a luz acender novamente.
Já estava ficando ansioso. Passavam-se os segundos. Pretensamente nada acontecia, pretensamente. Puta merda! Eu sabia o que estava acontecendo. Eu sabia. Filhos da puta. Tinha certeza daquilo. Era óbvio. Tanto era que começava a escutar os ruídos. Os safados, na minha frente.
Acendi a luz. O som era inconfundível e eu já me adaptava à falta de luz. Omeçava a enxergar os vultos. Acendi a luz já aos berros. Filhos da puta! Asquerosos!
Exato. Se atracando na minha frente. Na minha frente! Minha namorada e meu irmão.
Meu laço de sangue havia acabado ali, com aquele bastardo. Daquele filho da puta tinha certeza de não ser irmão.
Apartei os dois. Em um acesso de raiva, segurei a menina pelo rosto e bati. Foram tapas e mais tapas. Passavam algumas pessoas ao redor, olhavam e se iam. Raiva. Tanto fazia que todos vissem meu despropósito. Ela merecia a humilhação. Merecia ser apedrejada em praça pública. Isso mesmo, apedrejada. E visto que ninguém o faria, a tarefa cabia a mim. E, quanto menor eu me via aos olhos do público que observava a cena, maior era minha raiva e mais eu batia.
Quanto mais eu batia, tanto mais era a indiferença dela. Como se não estivesse percebendo o que acontecia. Ou ainda pior, como se aquilo não significasse nada. Como se os golpes não machucassem. Parei exatamente ao percebê-lo. Tanto fazia minha fúria ou nada. E a fúria imediatamente após era remorso. A desgraçada cuspia um sangue ralo misturado à saliva. Remorso do que? Aqueles sujos mereciam tudo, tudo aquilo. Que morressem todos. E, agora, que morressem sentido dor, pois eu também sentia.
Saímos do carro. E ela me diz: Eu não queria mais. O que?! Eu, não quero mais, Bernardo. Não é possível!! É possível, sim. Vadia!! Baixos! Vocês dois são a escória!
Sentia-me dilacerado. A história repetiasse mais uma vez.

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